A responsabilidade do sócio retirante da empresa
- Luciana Luppi
- 3 de mai. de 2023
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São muitos os casos em que os sócios retirantes da sociedade contratual, depois de longo período, são incluídos em processos de execuções de dívidas trabalhistas, mesmo sem participar da ação trabalhista principal, com a garantia do direito da ampla defesa, para depois, sofrer bloqueios judiciais e penhoras de bens.
Na prática, não há como se presumir que o sócio retirante possa ter conhecimento da ação simplesmente com o seu ajuizamento. Imperioso haver prova da ciência pelo sócio retirante da existência da ação para poder exercitar o seu direito de defesa e não ser no futuro surpreendido com constrição de seu patrimônio, sem o desenvolvimento do devido processo legal, como garante o inciso LIV do artigo 5º da CF/88.
Ora, não tendo conhecimento da ação, não é possível exercitar o seu sagrado e inquestionável direito de defesa e desta forma não pode, na fase de execução, vir a ter conta bloqueada diante da garantia constitucional inscrita no inciso LIV do artigo 5º da CF/88.
A jurisprudência recente acompanha a tese:
REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO. SÓCIO RETIRANTE. Apesar da ação trabalhista ter sido ajuizada no curso dos dois anos da data em que o sócio se retirou da sociedade executada, para que seja possível a sua responsabilização, nos termos do art. 1032 do Código Civil, entende-se ser fundamental a sua citação para integrar a lide na fase de conhecimento, ou prova de que conhecia a existência da ação por outra forma, para poder exercitar o seu direito de defesa e não ser no futuro surpreendido com constrição de seu patrimônio, sem o desenvolvimento do devido processo legal, como garante o inc. LIV do art. 5º da Constituição da República. (TRT-12 – AP: 00743200903012002 SC 00743-2009-030-12-00-2, Relator: ROBERTO LUIZ GUGLIELMETTO, SECRETARIA DA 2A TURMA, Data de Publicação DEJT: 20/10/2015)
Sobreleva informar a previsão contida no artigo 1032 do Código Civil, que estabelece que o sócio retirante ou excluído responde pelas obrigações da sociedade no prazo de até 2 (dois) anos após a averbação da sua retirada ou exclusão, não incide no caso concreto.
A regra prevista na Lei Civil é plenamente aplicável ao processo trabalhista por conferir segurança jurídica às relações, na medida em que fixa uma regra objetiva de limitação da responsabilidade, atento aos parâmetros da razoabilidade, exatamente nos termos do artigo 1032 do Código Civil, valendo destacar comentário ao citado artigo pela jurista Maria Helena Diniz:
“O sócio retirante, ou excluído, ou o herdeiro de sócio falecido, apesar de ter ocorrido a dissolução parcial da sociedade, e o rompimento do vínculo que o prendia à sociedade, não terá a sua exclusão imediata da comunhão social, que subsistirá entre ele e os demais sócios em tudo que for alusivo às obrigações sociais anteriores, até dois anos após a averbação da resolução da sociedade. O sócio retirante, ou excluído, deverá então, responder pelos débitos sociais existentes no instante em que deixou a sociedade. Continuará, ativa e passivamente, ligado à sociedade até que, nesses dois anos, se liquidem os interesses e responsabilidades que tiver nos negócios sociais pendentes. Mas se não providenciou aquela averbação, não estará, durante um biênio, desvinculado das responsabilidades pelas novas operações sociais, posteriores à sua retirada ou exclusão. (…)”. (Maria Helena Diniz, Código Civil Anotado, São Paulo, Saraiva, 2010, p. 713).
Nesse sentido, colhem-se arestos do E. TRT da 3ª Região:
EXECUÇÃO DO SÓCIO CEDENTE OU RETIRANTE. RECORRIDO (S) JBS S.A. AJUIZAMENTO DA AÇÃO DEPOIS DE TRANSCORRIDOS MAIS DE DOIS ANOS DA AVERBAÇÃO DA ALTERAÇÃO CONTRATUAL. IMPOSSIBILIDADE. Como bem se sabe, uma vez insolvente a pessoa jurídica, respondem os seus sócios pelas dívidas por ela contraídas, em face da teoria da desconsideração da personalidade jurídica da empresa, plenamente aplicável ao Processo do Trabalho, em que os créditos têm natureza alimentícia e, ainda, em face da proteção ao empregado hipossuficiente. Outrossim, é certo que o sócio cedente responde, solidariamente, perante a sociedade e terceiros pelas obrigações que tinha como sócio até 02 (dois) anos depois de averbada a alteração contratual, atinente ao seu afastamento, a teor do parágrafo único do artigo 1.003 do Código Civil Brasileiro. Como, no caso específico dos autos, a retirada do sócio, ora Executado, ocorreu de forma regular, com transferência total de suas quotas do capital social da empresa para os sócios remanescentes, tendo sido a alteração contratual devidamente averbada perante a Junta Comercial respectiva, em data muito anterior (quase oito anos) ao ajuizamento da ação, resta nitidamente afastada a responsabilidade do sócio retirante, o que se faz em nome do princípio da segurança jurídica que deve pautar os atos jurídicos praticados pelas partes. (TRT 03ª R.; AP 180/2006-112-03-00.5; Oitava Turma; Rel. Des. Márcio Ribeiro do Valle; DJEMG 16/11/2009)
EMENTA: EXECUÇÃO DO SÓCIO RETIRANTE. AJUIZAMENTO DA AÇÃO APÓS TRANSCORRIDOS MAIS DE DOIS ANOS DA AVERBAÇÃO DA ALTERAÇÃO CONTRATUAL. IMPOSSIBILIDADE. Como bem se sabe, uma vez insolvente a pessoa jurídica, respondem os seus sócios pelas dívidas por ela contraídas, em face da teoria da desconsideração da personalidade jurídica da empresa, plenamente aplicável ao Processo do Trabalho, em que os créditos têm natureza alimentícia e, ainda, em face da proteção ao empregado hipossificiente. Outrossim, é certo que o sócio chamado retirante responde, solidariamente, perante a sociedade e terceiros pelas obrigações que tinha como sócio até 2 (dois) anos depois de averbada a alteração contratual, atinente à sua retirada, a teor do art. 1.003 do Código Civil brasileiro. Como, no caso específico dos autos, a retirada da sócia, ora executada, ocorreu de forma regular, com transferência total de suas quotas do capital social da empresa para os sócios remanescentes, com a alteração contratual sendo devidamente averbada perante a Junta Comercial respectiva, em data anterior (quase três anos) ao ajuizamento da ação e já tendo decorrido mais de 02 (dois) anos da citada averbação, resta afastada a responsabilidade da sócia retirante, o que se faz em nome da segurança jurídica que deve pautar os atos jurídicos praticados pelas partes. (grifamos) (Processo: 0192400-87.2006.5.03.0142. Rel. Des. Márcio Ribeiro do Valle. DJ 16/02/2008. 8ª Turma. TRT – 3ª região.)
Assim, senão observada a limitação temporal, restarão violados os incisos II, XXII, XXXV, LXXIV do artigo 5º, da Constituição Federal, pois na qualidade de ex-sócios, os executados não devem responder pelos débitos. A violação é direta ao comando constitucional.
Destaca-se, ainda, o que prevê o parágrafo único do artigo 1003 do Código Civil ao estabelecer que, até dois anos depois de averbada a modificação do contrato, responde o cedente solidariamente com o cessionário, perante a sociedade e terceiros, pelas obrigações que tinha como sócio.
Ainda que as normas em comento visem tutelar o direito de terceiros, não se pode desconsiderar que no caso concreto deve-se salvaguardar o direito dos sócios retirantes de não responder eternamente pela pessoa jurídica da qual fez parte, mormente quando não evidenciada qualquer ingerência sua capaz de causar os descumprimentos trabalhistas. Ressalta-se, o código Civil fixou lapso temporal para a responsabilidade dos sócios retirantes de 2 (dois) anos da retirada da sociedade.





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